Israel Sampaio ganhou o primeiro lugar com performance sobre ácido abscísico, um hormônio vegetal que regula a desidratação das árvores da Amazônia. Banner: Débora Vale/ Inpa

 

Laboratório a céu aberto, a Base de Manejo Florestal do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI) foi palco para cientistas contarem seus trabalhos de forma criativa por meio da dança. Com movimentos marcantes e música vibrante, o engenheiro florestal Israel Sampaio explicou seu estudo de doutorado em um videoclipe dançante com uma canção com ritmos de forró, samba de gafieira e carimbó e foi um dos vencedores do concurso Dance Sua Tese (Dance Your Ph.D, em inglês) da Science, uma das mais importantes revistas científicas do mundo.

Lançado em 2008, o concurso teve a inscrição de cientistas de 12 países e 28 performances em quatro categorias: Ciências Sociais, Biologia, Química e Física. O vídeo de Sampaio foi o mais visto no Twitter do concurso, com mais de 15 mil visualizações, até o anúncio dos vencedores no dia 13 de março. No canal do Youtube de Israel Sampaio o vídeo dele já está com 9,2 mil visualizações.

O baiano de 33 anos fez mestrado no Programa Clima e Ambiente (PPG-Cliamb/ Inpa-UEA) e está concluindo o doutorado em Ciência de Florestas Tropicais (PPG-CFT) do Inpa, instituto com sede em Manaus e referência mundial nos estudos de biologia tropical. Sampaio estuda como a biossíntese de ácido abscísico (ABA), um hormônio regulador de estresse das plantas, pode influenciar na resposta das árvores ao aumento de temperatura e à seca. O estudante é orientado por Kolby Jardine (Lawrence Berkeley National Laboratory- LBNL/EUA, docente do PPG-CFT/Inpa) e coorientado pelo pesquisador Niro Higuchi (Laboratório de Manejo Florestal/Inpa) e pelo professor João Figueiredo (Universidade Federal do Amazonas/Ufam).

Segundo Sampaio, um dos primeiros processos fisiológicos da árvore em resposta ao aumento da temperatura e condições de seca, ou seja, condições de estresse, é a produção do hormônio proveniente de plantas, o fito-hormônio ácido abscísico. Um processo parecido ocorre com os seres humanos em situação de estresse, que passa a produzir mais cortisol, um hormônio que possui os mesmos elementos químicos do ácido abscísico.

O ácido abscísico atua no fechamento dos estômatos e induz a uma série de sinalizações químicas de defesa das árvores. Os estômatos são células presentes nas folhas das árvores responsáveis pelas trocas gasosas com a atmosfera (vapor d’água, oxigênio e compostos orgânicos volatéis), e com isso o ácido abscísico consegue regular a perda de água das árvores quando elas estão sob estresse hídrico e quando a temperatura é muito elevada.

“Eu me sinto lisonjeado com o resultado. Este é um projeto que foi idealizado e abraçado por muitos amigos e pesquisadores, envolvendo várias referências da vida. Nossa ideia foi levar a ciência para a sociedade de forma divertida, envolvendo a arte, a dança e a música”, revela Sampaio.

Os cientistas são preparados para fazer suas investigações científicas, publicar artigos - quase sempre em inglês, participar de congressos e outros eventos técnico-científicos. Mas isso vem mudando, e a necessidade dos cientistas se aproximarem e dialogarem com a sociedade ganhou impulso na pandemia da Covid-19, especialmente diante do negacionismo científico e do avanço das fake news. “Hoje uma das nossas preocupações é fazer com que a nossa ciência chegue ao máximo de pessoas”, contou o doutorando.

Para quem está na “estrada” há muito tempo, atuar com essa outra frente - a da popularização da ciência - pode ser um desafio ainda maior, mas não impossível. “A gente não foi treinado para fazer isso [popularização], não planejou, mas aconteceu. O resultado dessa iniciativa liderada pelo Israel é motivo de grande felicidade e orgulho para todos nós”, contou Niro Higuchi, que trabalha há mais de 40 anos no Inpa, atuando com inventário e manejo florestal.

Para apoiar o trabalho, Higuchi entrou na “dança” para contar pela arte, em vez das letras, o conhecimento que se vem levantando sobre o papel da floresta para a manutenção da biodiversidade e da vida. “Essa é uma grande vitória para a instituição e para o Programa de Pós-Graduação. Ainda que não tenhamos planejado, isso só aconteceu porque estamos atentos e porque há muitos anos o Inpa investe na pós-graduação”, completou.

 

Desafios

Participar do concurso da Science foi um desafio abraçado por mais de 40 pesquisadores e bolsistas de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado ligados ao Laboratório Manejo Florestal (LMF/Inpa) e ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia - INCT Madeiras da Amazônia do Inpa, além de egressos do Inpa e de outras instituições. Sampaio ainda contou com a participação da sua parceira de dança a dois a Rozane Mesquita (professora de História) e sua amiga violinista Dani Colares (professora de Música e Inglês). O doutorando e seus apoiadores levaram quase um ano para transformar a ideia em produto.

Tímido com as palavras, Sampaio se soltou com os ritmos pelos quais é apaixonado. O estudante cantou, dançou carimbó, forró e samba de gafieira para tratar de um tema complexo de forma leve, divertida e em linguagem compreensível a todos. Na produção do vídeo, ele atuou em tudo: direção, arte, cenografia e edição. “Foram três dias de filmagem e um mês editando. Sentei ao lado do filmmaker e ajudei a montar o vídeo do jeito que eu idealizei”, lembra Sampaio.

A música Canção foliar da Amazônia, trilha sonora do videoclipe, é emocionante e transmite de forma poética a ciência envolvida na Tese de doutorado de Sampaio.  A composição da música foi um grande feito de um grupo de amigos músicos e cientistas pelo qual Sampaio tem uma grande admiração no cenário musical de Manaus.

Sampaio contou com Ramon Baptista (Dr. em Genética pelo Inpa - multi-instrumentista) que é o compositor e cantor da música, Cassiano Gato (Dr. em Ecologia do Inpa, baixista da canção), Júlia Linhares (Ma. Agricultura no Trópico Úmido, PNUD e multi-instrumentista, percussionista da canção) e Dani Colares (Ma. em Antropologia pela Ufam, professora de música e inglês, violinista da canção). Todos eles fizeram parte do coral, inclusive Adélia Sampaio (Postdoc do LMF). “Toda emoção que sentimos ao ver o vídeo não seria possível se não fosse essa grande dedicação e paixão dos meus amigos em contribuir com a ciência, cultura e arte na Amazônia”, ressalta Sampaio.

Apoio

A produção do vídeo contou com o apoio do LMF e INCT-Madeiras da Amazônia do Inpa, pesquisas que recebem financiamento da CNPq, Capes e Fapeam, e do Grupo de Pesquisa Química Aplicada à Tecnologia GP-QUAT da Universidade do Estado do Amazonas (GP-QUAT/UEA), liderado por Sérgio Duvoisin.

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